A organização da sociedade civil, Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, vem a público manifestar o seu repúdio às lamentáveis declarações do Juiz de Direito Paulo Augusto Oliveira Irion, da 6ª Vara Criminal de Porto Alegre, que, no dia 14 de outubro, relaxou a prisão em flagrante de um indivíduo acusado de estupro de uma adolescente de 16 anos, ocorrido no último domingo. Segundo o noticiado pela imprensa, a decisão foi tomada com base no fato de o acusado ser réu primário. Justificando a decisão, o juiz declarou que o acusado não teria antecedentes criminais e o estupro seria um fato isolado na vida dele.
O dito “fato isolado” revela uma profunda desconsideração dos direitos, não somente da vítima, mas de todas as mulheres. O temor em relação à violação do corpo é um drama vivido por todas, e a manifestação do Poder Judiciário no sentido de banalizar um estupro, tratando-o como um crime menor, fortalece a percepção de que nossos corpos são vulneráveis e que pertence só a nós, mulheres, a responsabilidade de protegê-los.
No estado do Rio Grande do Sul, conforme a Secretaria de Segurança Pública, foram registrados 525 casos de estupros no primeiro semestre de 2014. O número, ainda que elevado, é distante da realidade ao consideramos a elevada subnotificação, típica da violência sexual. A Secretaria de Políticas para as Mulheres estima que no Brasil a cada 12 segundos uma mulher é estuprada. A Organização Mundial da Saúde calcula que uma em cada cinco mulheres se tornará vítima de estupro ou de tentativa no decorrer da vida.
A cultura da violência sexual contra meninas, adolescentes e mulheres não é um fato isolado. O Brasil, como signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), tem o dever de combater a violência de gênero, não apenas em suas leis, mas, principalmente, em suas práticas. Que o triste exemplo da Índia, onde a violência sexual contra mulheres e meninas é tolerada, não nos sirva de exemplo.
Refutamos essa postura que desqualifica a violência praticada nos corpos e nas almas das vítimas e que só contribui para a revitimização institucional.
A entidade dará conhecimento dos fatos à Corregedoria-Geral de Justiça do estado e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para as providências que se fizerem cabíveis.”