A organização Terra de Direitos e a Articulação Pacari tiveram presença destacada no 12° Encontro da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, realizada de 6 a 17 de outubro, em Pyeongchang, na Coreia. Além da participação no evento como um todo, as duas organizações apresentaram e promoveram o debate sobre o Protocolo Comunitário das Raizeiras do Cerrado em dois eventos separados.
A iniciativa é uma experiência inédita no Brasil, criada graças aos esforços das mulheres raizeiras. O documento busca criar instrumentos políticos para que se garanta o direito de exercício da medicina tradicional, além de contribuir para a promoção, manutenção e respeito dessas práticas. A importância das raizeiras na conservação ambiental e o impacto da construção de grandes projetos na região de Cerrado também devem ser reconhecidos.
A construção da identidade social das raizeiras foi apresentada pela Pacari como estratégia para conquistar o direito de exercer a medicina tradicional e poder demandar políticas públicas de proteção ao conhecimento tradicional e de conservação do Cerrado. A Articulação Pacari é responsável pela criação da primeira farmacopeia popular do Brasil. Raizeiras e raizeiros são povos tradicionais do bioma Cerrado, detentores de conhecimentos tradicionais transmitidos através de gerações, que cuidam da saúde comunitária através do uso de recursos naturais e da espiritualidade. O seu ofício abrange a identificação de plantas medicinais e dos seus ecossistemas de ocorrência, assim como o conhecimento de técnicas sustentáveis para a coleta de plantas, o preparo de remédios caseiros e a sua indicação para diversos males e doenças.
“A delegação brasileira reconheceu nossa iniciativa de construção do Protocolo Biocultural das Raizeiras do Cerrado como uma ação de implementação do artigo 8j da Convenção de Diversidade Biológica no Brasil, na perspectiva das comunidades locais do cerrado”, disse a coordenadora da Pacari, Lourdes Cardozo Laureano.
O artigo 8j preconiza respeitar, preservar e manter o conhecimento, inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e incentivar sua mais ampla aplicação, com a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a repartição equitativa dos benefícios oriundos da utilização desses conhecimentos, inovações e práticas.
O Protocolo Comunitário das Raizeiras do Cerrado na versão em inglês (disponível abaixo para download) foi distribuído às e aos participantes e deve ser lançado oficialmente, em português, no Encontro Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, a ser realizado em novembro deste ano.
Pacari
A Articulação Pacari, parceira da FLD, é uma rede socioambiental formada por organizações comunitárias que praticam medicina tradicional através do uso sustentável dos recursos naturais do bioma Cerrado. As organizações comunitárias participantes representam principalmente mulheres agricultoras, extrativistas, assentadas da reforma agrária, indígenas, quilombolas, agentes das pastorais da saúde e da criança.
Protocolos comunitários
Os protocolos comunitários, estabelecidos pelo Protocolo de Nagoia, são desenvolvidos por populações tradicionais, comunidades itinerantes ou locais e estão ganhando cada vez maior reconhecimento. Eles servem como instrumentos para empoderar as comunidades para a participação em iniciativas comerciais com repartição de benefícios (como a experiência da Cooperativa Comaru, pioneira no país, localizada no município amapaense de Iratapuru, que possui contrato com uma empresa nacional de cosméticos para acesso a patrimônio genético e conhecimento tradicional associado, com repartição de benefícios), facilitando o desenvolvimento sustentável e a conservação da biodiversidade local.
Foto: Articulação Pacari