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Manifesto Reivindicatório sobre a Lama no Rio Doce

Manifesto Reivindicatório sobre a Lama no Rio Doce
30 de novembro de 2015 zweiarts

À Presidência da República Federativa do Brasil
a/c do Excelentíssimo Senhor Jaques Wagner Ministro Chefe da Casa Civil

Assunto: Manifesto Reivindicatório sobre a Lama no Rio Doce

Senhor Ministro,

Nós, aqui representados por Igreja Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil, através do Sínodo Espírito Santo a Belém e do Sínodo
Sudeste; Igreja Católica Apostólica Romana, através da Diocese de Colatina;
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, através da Regional ES; Movimento dos
Pequenos Agricultores e Sindicato dos Pequenos Agricultores, comungamos das
mesmas reflexões e reivindicações, que apresentamos:

O Rio Doce (5ª maior bacia hidrográfica brasileira), vem
enfrentando uma das piores secas dos últimos 70 anos. Além do assoreamento,
ainda em setembro de 2015, foi registrada uma lâmina d’água de apenas 10 cm de
profundidade em alguns pontos (conforme a Agência Nacional de Águas), quando o
normal seria de pelo menos 1,50 m. Não bastasse a falta de chuvas, perplexos
vivenciamos a destruição do que restou da biodiversidade. Presenciamos, no Vale
do Rio Doce, um dos maiores crimes ecológicos da história do nosso país. A
contaminação e a morte do Rio Doce e a consequente falta de água são
resultantes da falta de manutenção das represas de rejeitos pelas mineradoras.
O rompimento de barragens era uma possibilidade já prenunciada há vários anos,
dada à falta de fiscalização ambiental às mineradoras.

O rompimento da barragem de rejeitos de minério de Fundão, ocorrido
em Mariana/MG, pertencente à mineradora SAMARCO (empresa da Vale e da
mineradora anglo-australiana BHP Billiton), lançou em torno de 25 mil piscinas
olímpicas de rejeitos tóxicos no Rio Doce. Esta lama, que retirou o vilarejo de
Bento Rodrigues/MG do mapa, ceifando muitas vidas, vem descendo por vários
Municípios de Minas Gerais e Espírito Santo, rumo ao Oceano Atlântico.

Na Bacia do Rio Doce todo o ecossistema está sendo sufocado
e dizimado. O abastecimento de água de mais de meio milhão de pessoas das
cidades de Governador Valadares, Baixo Guandu, Colatina, Linhares e pequenos
povoados adjacentes está comprometido. Em Colatina, vemos pessoas desesperadas
estocando água. O comércio explora o desespero do povo nos preços abusivos da
água mineral.

Segundo informações de alguns órgãos ambientais, a
recuperação do Rio Doce pode se estender por um período de 100 anos. As
empresas envolvidas fizeram declarações de solidariedade e propuseram ações
pouco convincentes e esperançosas para mitigar o impacto desse crime ambiental.
Até então, a Samarco não apresentou um plano nitidamente esclarecedor e
emergencial a respeito da salvaguarda da vida do rio que tranquilize as
populações envolvidas. Enquanto isso, os rejeitos vêm seguindo o seu curso.

A degradação do ambiente, o desrespeito à vida do
ecossistema e as consequentes catástrofes advêm da insensatez e da sede pelo
poder de alguns grupos econômicos. Na corrida pelo lucro fácil não há
constrangimentos e espaço para consternação diante de um amontoado de lama
tóxica que destruiu casas e ceifou vidas. A crueldade desse crime evidencia a
insensibilidade do grupo que detém o controle das mineradoras, ao exaurir todos
os recursos naturais, custe o que custar. Experimentamos essa insensibilidade
neste crime contra o Rio Doce e da vida em seu entorno. Incluem-se nesse rol as
vidas humanas ceifadas pelo soterramento.

Enquanto a tragédia segue, há vozes do fanatismo religioso
que atribuem ao acontecido sinais de punição divina e do fim do mundo. Isso é
fruto de uma visão fundamentalista, distorcida e apática de pessoas que sempre
optam pelo conformismo e em omitir-se diante da responsabilidade frente à
degradação da natureza. O fanatismo esquece que somos cuidadores da criação.
Situações como essa são frutos da ganância e da inconsequência humana.
Portanto, entendemos que o ser humano é responsável pelo cuidado com a criação
divina. Por isso, reivindicamos e propomos o seguinte:

1. Apuração ágil e minuciosa das responsabilidades por este
crime contra a vida;
2. Aplicação rigorosa das leis ambientais a todos os responsáveis;
3. Criação de mecanismos que envolvam a sociedade civil no controle, no
acompanhamento e na aplicação das leis;
4. Comprometimento das instituições governamentais na tomada de todas as
providências cabíveis, tendo por base as necessidades dos que foram direta ou
indiretamente atingidos, fazendo valer os direitos e a dignidade do ser humano;
5. Construção urgente de um plano de revitalização e de manejo da Bacia do Rio
Doce, sob o controle da sociedade civil, que assegure o direito de uso da água
para os pequenos agricultores e ribeirinhos dos afluentes do Rio Doce, bem como
da população urbana. Deve ser garantida a subsistência desses agricultores,
garantindo-lhes os meios necessários para continuar produzindo em sua
propriedade;
6. Elaboração de um plano de subsistência alternativa para todas as comunidades
de povos tradicionais ribeirinhos que vivem do Rio Doce e afluentes;
7. Criação de um plano de manutenção e recuperação das nascentes e fiscalização
rigorosa do uso das águas profundas do subsolo;
8. Constituição de um conselho autônomo para gerenciamento dos fundos
destinados à recuperação da Bacia do Rio Doce, essencialmente composto por
representantes da sociedade civil organizada. A recuperação da Bacia do Rio
Doce deve ser custeada pelos grandes empreendimentos que fazem uso da água do
Rio Doce, a exemplo da Samarco, das indústrias de celulose e outras;
9. Investimento público e privado em projetos de armazenamento de água para o
abastecimento dos municípios capixabas e adjacentes.

Nesse clamor à vida, aguardamos ações urgentes.

Assinam as Entidades acima elencadas:

P. Dr. Nestor Paulo Friedrich                       Dom Joaquim Vladimir Lopes Dias
Pastor Presidente da IECLB                        Bispo da Diocese de
Colatina – ES

P. Sin.
Joaninho Borchardt
P. Sin. Geraldo Graf
Sínodo Espírito Santo a Belém – IECLB     Sínodo Sudeste – IECLB

Rev. Ariel Irrazábal Montero Raul Krause
Presidente do CONIC/ES Movimento dos Pequenos Agricultores/ES

José Izidoro Rodrigues
Diretor de Políticas Agrícola e Meio Ambiente – FETAES

CC
Lutheran World Federation – LWF (Genebra)
Fundação Luterana de Diaconia – FLD (Porto Alegre)
Sínodo Sul de Ohio (ELCA – EUA)
Evangelische Kirche in Deutschland – EKD (Alemanha)
Confederação dos Bispos do Brasil – CNBB
Conselho Mundial de Igrejas – CMI (Genebra)
Papa Francisco (Roma)

Fonte: Portal Luteranos